sexta-feira, 28 de setembro de 2007

The Dreamers | Bernardo Bertolucci

Quando resolvi escrever sobre Cinema varias dúvidas pairavam sobre minha cabeça, poderia optar por começar escrevendo sobre os grandes clássicos, ou fazer uma coletânea de gêneros, ou até descer o sarrafo em mega produções comerciais megalomaníacas e inúteis para a cultura cinematográfica. Porém, a escolha instantânea foi a de escrever sobre filmes que me emocionaram, que cutucaram minhas frustrações, que fizeram com que me identificasse com eles por algum motivo torpe ou simplesmente por ser mais fácil, na minha opinião, escrever sobre o belo.
The Dreamers (2003), de Bernardo Bertolucci é um desses filmes. Lembro de ter lido alguma coisa a seu respeito quando do lançamento, lembro ainda de ter passado diversas vezes por ele em prateleiras de locadoras de video e relutei em vê-lo, não por causa do filme em si, mas sim por outras opções que eram vigentes no momento.
No filme, Mathew (Michael Pitt) é um estudante de intercâmbio que começa a freqüentar a Cinemateque Francaise, onde conhece os gêmeos Theo (Louis Garrel) e Isabelle (Eva Green). O plano de fundo desse encontro é o turbilhão Paris, 1968. Na ocasião Henry Langlois, então curador da Cinemateque havia sido deposto, o que gerou indignação entre os jovens cinéfilos e culminou com uma revolta nas ruas de Paris. Além de explorar com maestria temas históricos como este, Bertolucci passeia pela vida de três jovens idealistas (a palavra passeia aqui não vem por acaso, os longos "passeios" por Paris feitos por uma Steadcam transformam todo o filme em uma esperiência, uma viagem). Bertollucci nos mostra também, como de costume, seres humanos transformando suas vidas através do amor, do carnal e do proibido. Nesse contexto ele nos apresenta, a então estreante (Estonteante!) Eva Green. Ela nos brinda com uma Isabelle apaixonante desde sua primeira aparição em cena, quando Mathew a encontra atada aos portões da Cinemateque, até quando incorpora a versão mas libidinosa da Vênus de Milo que já vi.
O encanto de Os Sonhadores vem também sustentado por suas incontáveis referências. A todo momento se é movido a sobresaltar-se devido a uma referência surpresa durante a exibição. Isabelle, por exemplo, diz que nasceu na Champs Elysées e que suas primeiras palavras foram "New York Herald Tribune" (palarvas de outra bela, a Patricia de "Acossado"). Theo cai em uma sombra em forma de cruz como em "Scarface" de Howard Hawks.
O três ainda jogam conversa fora, discutem o livro vermelho de Mao, colocam Chaplin contra Buster Keaton e Hendrix versus Clapton, bebem vinho e se amam, se amam de uma forma que só Bertolucci poderia conceber. No seu cinema o que é pornográfico torna-se erótico e o que, achariam alguns, grotesco, torna-se plástico e essencial para a narrativa.
The Dreamers é uma ode ao cinema e é também uma confirmação de que a sétima arte está intrinsecamente ligada a forma com que nos comportamos e vivemos.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Nova seção: Tendência

A palavra tendência vem do latim, tendentia. Significa disposição natural, intenção, propósito, força pela qual um corpo tende a mover-se em determinado sentido. Particularmente, prefiro entender que tendência é tudo aquilo que você irá vestir, comer, usar daqui a algum tempo. E como descobrir o que é uma tendência? Não é das tarefas mais fáceis, simplesmente por que em geral o que é tendência se impõe por si só, levando todo mundo junto. Quando você menos espera já está querendo aquele aparelho bacana que o tal famoso, loiro, bonito tem. Está almejando usar aquele vestido que a tal modelo usou na passarela e já quer comer no restaurante novo chic-no-úrtimo. Ou seja, tendência pode ser inveja, consumismo ou a simples vontade que fica e se espalha.
Comecei meu primeiro post aqui falando sobre tendências, pois isso será minha inspiração para a blogar. Tudo o que é novo e babadex eu corro atrás. Por que não expor aqui?
Afinal, você também está sujeito ao novo como todo mundo. Se não fosse isso, você certamente não iria ler este blog, afinal bloggar é tendência!
Tendemos, então, a brincar com as novidades!

Da redação: Clebs é blogueiro há anos, porém só voltou a exercer seus poderes bloguísticos esse ano, após insistência de alguns amigos e sua necessidade de mostrar novamente a cara (no Tudo Mundo). Trará aqui as últimas tendências e comportamentos, sem simplesmente cair no fashionista, sem cair no banal. Arrasa, Clebs!

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Best Seller?

Passeios semanais a livrarias são programas obrigatórios para mim, pois não há coisa que eu mais ame (opa, há sim, mas não temos ainda a seção "Sexo" aqui n'Os Bloguistas) que os livros. E cada vez mais as pessoas descobrem nas livrarias espaços de diversão, contrariando a aversão incutida em nossas cabecinhas quando no Ensino Fundamental (na minha época, Primeiro Grau) enfiavam-nos Coleção Vagalume goela abaixo e, no Segundo Grau (ou atual Ensino Médio), nos castigavam com Aluísio Azevedo, Machado de Assis e congêneres (que apenas descobrimos gênios mais tarde, quando descobrimos, não é?). Vejo hoje gente de todas as idades e com diferentes níveis culturais se embrenhando nas veredas às vezes tranqüilas, às vezes turbulentas da literatura. Com muito gosto vejo essa [r]evolução nos brasileiros, que ainda lemos tão pouco (em média 1,8 livros por ano, menos da metade dos EUA e da Europa. Num ranking de 30 países, ficamos em 27º em leitura, enquanto a Argentina, aqui do ladinho, ficou em 18º*).
E me espanto com a quantidade de best sellers que se produz atualmente. São pilhas de mais vendidos aqui e ali, com pôsteres, cartazes e chamarizes de todos os tipos para aqueles que todos lêem. Uns caçam pipas, outros fazem mágica, outros ainda procuram pelo Santo Graal ou andam quilômetros por um deserto espanhol, em meio a bruxos e outros males. Uns bem escritos, outros nem tanto. E a caixa registradora tilinta, enchendo as burras das editoras, com a premissa de tornar os leitores mais inteligentes. Será?
Independente da leitura, antes duas horas de Dan Brown por dia do que cinco de novela das 8. Antes 1 horinha de monges executivos subindo o monte Everest do que mais de 4 horas de Faustão aos domingos. Torço que os bons ventos da literatura sejam cada vez mais possantes, que as editoras antigas possam renovar seus catálogos, melhorar e reduzir o preço dos livros (o que ainda é um revés na hora da decisão de compra para a maioria das pessoas) e as editoras pequenas possam ousar mais e trazer para nós a verdadeira literatura. Pode ter best seller, mas que sejam good best sellers.

E por falar em best seller, há um livro com esse nome, que parece bem engraçado. História de um pai que resolve se matar e deixar 5 milhões de libras pro filho que não é muito afeito ao trabalho, mas com uma condição: que ele escreva um livro sobre o pai milionário e transforme o livro num best seller. Fica a dica: Best Seller, de Will Rhode.

Abr@ço

Peterso Rissatti


*Fonte: Folha de São Paulo
Foto superior: Revista eletrônica Sagarana.

domingo, 16 de setembro de 2007

Direitos Aurorais em Tempos de Internet


Um dia desses estive fazendo uma visita a um blog cujo post da vez era um protesto indignado, embora totalmente cabível, sobre cópias não autorizadas de elementos autorais em sites da Internet.

Infelizmente, o protesto da menina não é uma voz solitária clamando no deserto – a cada dia, a exemplo do que ocorre na vida real, o “Pixelworld” vem sendo invadido pelos assaltos à propriedade intelectual. O fato de ser uma pirataria virtual não torna essa modalidade de bandalheira menos criminosa; porém, tendo em vista que os crimes cometidos na Internet ainda não possuem legislação específica, por serem um fenômeno relativamente recente, os casos de plágios virtuais continuam a se proliferar desenfreadamente.

Mas o que é exatamente o direito autoral? O direito de autor tem por objetivo garantir ao autor uma participação financeira e uma moral em troca da utilização da obra que criou. Na prática, o que se protege são as obras e não os autores. É desta forma que eles, os autores, se tornam beneficiários dessa proteção. O registro de obra intelectual é meramente facultativo, voluntário, mas pode servir como prova de anterioridade em relação à obra idêntica publicada por terceiros sem autorização.

O autor tem, sobre sua obra, direitos morais e patrimoniais. A legislação que ampara os autores convencionais é extensiva às publicações virtuais, e prevê distingue claramente os casos de plágios daqueles que não constituem ofensa ou violação da propriedade intelectual individual. O registro é feito no Escritório de Registro de Direitos Autorais vinculado à Biblioteca Nacional. Há algumas formalidades a seguir, nenhuma que seja particularmente difícil. A obra será aceita para registro mesmo sem que esteja publicada, bastando que seja encadernada em uma das modalidades de encadernação que o Escritório aceita (pode ser capa de plástico e espiral). Pode-se fazer o registro através do Site da Biblioteca Nacional (http://www.bn.br/site/default.htm), ou da biblioteca de sua cidade que for conveniada com a Biblioteca Nacional para efeito de Direitos Autorais. Qualquer outro local pode ser suspeito de tentar manipular o autor para alguma finalidade duvidosa.

Para maiores esclarecimentos existem alguns sites bastante úteis, entre os quais:




Além do registro do direito autoral, um grande passo na regulamentação da propriedade intelectual digital foi a criação do Creative Commons, uma espécie de licença digital na qual você define os tipos de utilização que terceiros podem dar à sua obra. Eu mesma aderi à idéia - que quiser conferir pode visitar o link ou dar uma olhada no meu blog pessoal, para ter uma noção melhor do que significa.

E é isso. Já que, no mundo real, os ladrões permanecem dominando a situação – inclusive nas instâncias mais supremas do poder e da democracia nacional – tentemos fazer com que, ao menos no mundo virtual, a roubalheira intelectual tenha o castigo que merece...


Beijos a todos!


terça-feira, 11 de setembro de 2007

Carioca

Chico Buarque não é novidadade, mas com certeza seus trabalhos sempre são. Sabe manter seu estilo consagrado, sua simpatia, harmonia e também sabe se renovar. Com uma voz rara e muito fora do que algumas pessoas consideram como bonita, Chico sempre impressiona.

Carioca é mais um trabalho de Chico que já chama a atenção pela arte. Quando você abre a caixinha do álbum dá de cara com uma espécie de mapa bem interessante da capital fluminense, fotos, cd e, agora numa nova edição, um dvd. É sobre esse dvd que quero comentar.

Em mais ou menos 50 minutos de gravação, podemos observar como Chico trabalha e se dedica por inteiro em sua obra. É intenso o trabalho dos produtores musicais, artísticos, músicos e de toda equipe envolvida. Chico mostra um lado muito humano, levando seus netos para um dia de gravação, também se revela uma pessoa que percebe o talento do próximo, escolhendo para fazer parte do cd, Bolero Blues, música composta por Jorge Helder, baixista que participou da produção de seu disco.

Para quem não conhece Carioca, Chico retrata exatamente o cotidiano do carioca, desde o subúrbio, pobreza, passando por atrizes, mares, boleros, pensamentos, ricos, famosos. A cada música, uma forma diferente de mostrar o Rio, diferentes pensamentos que se cruzam e mostram a realidade num disco deliciosamente relaxante e de alto nível.

É injusto destacar apenas algumas faixas do cd, mas vale muito a pena ouvir Ode aos Ratos, onde Chico canta um rap, Renata Maria que retrata uma certa sensualidade e dá destaque a instrumentos como guitarra, As Atrizes, Subúrbio e Ela faz Cinema que talvez seja a mais conhecida do disco.

Para terminar, vale lembrar que Chico deixou claro que o Cd levou esse título em homenagem aos paulistas, pois quando morou em São Paulo não era chamado pelo nome... era chamado apenas de carioca (brincadeira dele!).


Grande abraço,

Tiago Soarez


domingo, 9 de setembro de 2007

O quieto animal da esquina

"A minha literatura bebe da fonte oral, presente na entoação das sílabas quando
se vive o estado musical, o canto. Talvez por isso eu tenha fascínio por frases
meio serpenteantes. Há um certo ritmo impossível aí, as sentenças que dobram
quarteirão trazem em si o mito da simultaneidade, o aspirar dizer tudo de uma
vez só."

João Gilberto Noll não é uma unânimidade entre os literatos. Apesar de seus três prêmios Jabuti (o prêmio máximo da literatura brasileira) e de uma infinidade de textos adaptados para o teatro e cinema. Um ilustre desconhecido para a maioria dos leitores brasileiros, o gaúcho Noll se farta da realidade para trazer à tona os desajustes de uma humanidade decadente, apodrecida por valores vis, insanos e caóticos. É considerado um radical entre seus pares, dono de prosa ferina e profunda. Em entrevista à revista Livros (Ano 2, n. 18) ele escancara a sua opção por ser um contador de histórias, um ativista da linguagem, que não prima pela veracidade do que escreve, mas pelas sensações que causa no leitor de suas obras. Exatamente assim vejo O quieto animal da esquina, um pequeno livro do autor que jorra em 94 páginas, intenso. Considerado (e considerando-se) o autor dos excluídos, dos desterrados, do homem da rua, Noll trabalha no fôlego da língua falada, em frases e parágrafos intermináveis, para imprimir à obra o constante afã da resolução irresoluta, do fim infindável, das contradições interditas. Ao ponto mesmo de ser, paradoxalmente, inverossível se olharmos pelo ponto lógico dessa obra: história de um rapaz que acaba de sair da adolescência, mora com a mãe em um apartamento invadido de um prédio abandonado, em meio à marginália, às drogas e outras mazelas. Certa feita, sozinho em Porto Alegre após a mãe decidir morar um uma tia no interior, é acusado de estupro, preso e depois enviado a uma unidade correcional, onde é adotado por alemães numa situação deveras incomum: um clima permeado de doença e morte assola seus benfeitores, enquanto ele se debate na busca de uma melhora em sua situação de vida, melhora imediata, urgente. Um ponto interessante (ou quase) é a constante inspiração do rapaz, que volta e meia escreve poemas. Nesse sentido, o crítico Manoel da Costa Pinto, que escreve a orelha do livro, diz que O quieto animal da esquina seria um "romance de deformação, em oposição ao Bildungsroman, ou romance de formação de origem romântica." O Bildungsroman é a definição de obra onde o protagonista cresce moral, economica e socialmente no decorrer do livro, alcançando a condição de cidadão cioso e ciente de seus atos, consciente do mundo à sua volta e cumpridor de seus deveres perante o universo ao seu redor. E a pequena narrativa de Noll é exatamente o contrário, o protagonista se vê cada vez menos tentado a ser bom e respeitoso, muito mais inclinado se vê para acomodar-se na condição de protegido dos seus pais adotivos.
Talvez a inverosimilhança da linguagem tão apurada do rapaz em certos pontos do livro se dê pela sua "vocação" de poeta, talvez ele tivesse mesmo vocabulário para narrar sua própria história de maneira tão rica e poética, mas não me convenceu nesse sentido. Apesar disso, Noll nos leva à visão do flâneur (aquele que perambula pelas grandes cidades em busca de reflexões sobre a condição humana) pelo seu personagem que nada mais busca que a solução para sua própria vida, e isso realmente vale a pena.


Abr@ço


Peterso Rissatti

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

O Grande Chefe

Lars Von Trier é louco e fez uma comédia, uma das boas. Em O Grande Chefe ele consegue carregar, como nunca carregou antes, sua obra do mais puro cinismo; coisa que em seus filmes sobram. Dessa vez ele não resolveu abordar dramas de filhas de mafiosos (Dogville) nem colocar adultos pra babar (Os Idiotas), colocou em cena uma crítica ao comportamento dos atores no cinema. Ravn (Peter Gantaler) engana os funcionários de sua empresa dizendo que ela é comandada, dos EUA, por um chefe maior. Com isso ele cria uma crença quase divina em torno do empresário inexistente criando uma relação fictícia, virtual, com seus gerentes. Cristoffer, vivido por Jens Albinus (o chefão da trupe d’Os Idiotas) é um ator contratado por Ravn quando se torna necessário fazer uma grande negociação onde é imprescindível a presença física do “dono” da empresa.

Nesse contexto Cristoffer abraça um papel sem ter nenhuma informação básica sobre o personagem - quando começa nem sequer sabe o nome do grande chefe e se vê totalmente perdido em conflitos que vão desde o ódio que alguns dos gerentes manifestam de imediato – o que acaba em alguns bons sopapos – até uma proposta de casamento feita via e-mail que ele, sem saber do que se trata, acaba confirmando. É nessa trama que Von Trier descarrega sua metralhadora giratória crítica. Ele contesta o modo como os atores se comportam no que diz respeito a construção do personagem. Isso fica evidente pois Cristtofer acaba se envolvendo mais do que lhe fora exigido.

Reafirmando a máxima hitchcockiana: “Ator é gado”, o dinamarquês de 51 anos que foi junto com Thomas Vinterberg um dos fundadores do manifesto Dogma 95 traz reflexões sobre o cinema moderno. Seu cinema é cru, sem planos sensacionais e sem todo o glamour do meio, o que ajudou Von Trier a dispensar o diretor de fotografia e tornar os planos não tão trativos para os olhos. Porem, trabalhando sempre com temáticas que mexem com o espectador das mais diversas formas acaba por transformar a tela em uma janela onde a luz da hipocrisia não passa e sempre se tem lugar pra uma cutucada a mais em uma sociedade que Lars Von Trier parece abominar cada dia mais.

Thiago Lira